A
dona de casa Ana Costa Jardim, 70, não confia na água fornecida pelo
Sistema de Abastecimento Autônomo de Água e Esgoto de Belém (Saaeb).
Também moradora da rua Tiradentes, o genro foi quem cavou o poço e
colocou uma bomba para puxar água para a caixa, que supre todas as
necessidades da família. “Uso um pedaço de pano na torneira e em um dia
com a água da Saaeb ele fica mais sujo do que em uma semana usando a
água do poço”, compara. O uso da bomba representa um gasto extra na
conta de energia elétrica, mas ela acredita que compensa por poder usar
uma água mais limpa e sem “gosto de ferrugem”.
Entre
os cuidados que ela toma, estão a tampa improvisada para não deixar
cair lixo ou bichos, jogar água sanitária uma vez por mês e fazer os
filhos limparem o poço anualmente. Assim como Neuza, ela não sabe
precisar a profundidade do reservatório. “Quando os vizinhos das outras
ruas pedem para encher os garrafões eu deixo, porque água não se nega
para ninguém. Além do mais, ninguém nunca passou mal e a gente consome
todo dia. Uso para cozinhar e beber, mesmo sem ferver ou filtrar”,
admite.
Poço amazonas ou poço escavado é o tipo existente nas casas de Ana e Neuza, também conhecida popularmente como “poço de boca” e geralmente com 2 a 20 metros de profundidade, segundo o professor Milton Antonio da Silva Matta.
Poço amazonas ou poço escavado é o tipo existente nas casas de Ana e Neuza, também conhecida popularmente como “poço de boca” e geralmente com 2 a 20 metros de profundidade, segundo o professor Milton Antonio da Silva Matta.
DOENÇAS
Ele
é um dos pesquisadores do Instituto de Geociências e coordenador do
Mestrado Profissional em Recursos Hídricos da UFPA. Matta monitorou a
incidência dos poços na RMB na última década e observou que o número
dobrou neste período. “A prática se intensificou, pulando de cerca de 20
mil para 40 mil. A população não confia na água fornecida, que em
muitas áreas é de baixa qualidade, quando tem. No entanto, o poço é uma
fonte de doenças de veiculação hídrica e não é recomendado”, explica.
Ele esclarece que o principal problema dos poços é a ausência das
condições adequadas de higiene, por serem mal construídos na maioria das
vezes. “Mesmo fervendo esta água, existem bactérias termotolerantes, ou
seja resistentes ao calor. O uso de filtro também não é o suficiente”,
alerta.
Ainda
de acordo com ele, o potencial de contaminação bacteriológica dos poços
é muito alto e doenças como febre tifoide e reações alérgicas podem ser
contraídas. “O Ministério Público deveria se voltar para essa questão,
assim como a Cosanpa (Companhia de Saneamento do Pará) precisa mudar o
sistema de abastecimento atual, oferecer um serviço de qualidade para os
habitantes”, completa.
Aproximadamente
30% da capital paraense é abastecida pela Cosanpa com água de poços,
assegura a presidente da Companhia, Noêmia Jacob. “São poços profundos,
com no mínimo 80 até 200 metros e a água passa por tratamento. Essa que é
a diferença dos poços particulares e onde está o perigo, pois esse
líquido normalmente tem alta concentração de ferro, além da contaminação
também”, acrescenta. Ela argumenta ainda que muitas pessoas, mesmo que
estejam na área de cobertura, optam pelo poço para tentar reduzir
custos. Atualmente, pouco mais de 60% de Belém é coberta pela Cosanpa,
com alguns setores atendidos por poços, funcionando como “sistemas
isolados”.
“Seria
ideal ter rios perenes e prover todo o abastecimento deles, mas em
Belém você não consegue fazer isso. Em lugares como a avenida Augusto
Montenegro por exemplo, onde a ocupação populacional tem crescido muito,
funciona melhor criar um microssistema e fazer a captação com poços”,
defende. A deficiência no fornecimento ainda é um dos principais
problemas da população e Noêmia prevê investimentos de R$ 1,2 bilhão em
todo o Estado, sendo R$ 300 milhões só em Belém, para os próximos anos.
Segundo ela, a meta é ampliar a rede e alcançar 80% de cobertura, e
depois a universalização. Em Icoaraci, há investimento previsto para a
adutora da Augusto Montenegro e a Cosanpa aguarda as negociações com a
prefeitura para assinar o contrato de concessão e assumir a Saaeb.
“Somente depois serão realizados os levantamentos para identificar o que
precisa ser feito no sistema do distrito para melhorar a qualidade e
quantidade do abastecimento”, garante.
Fonte: saneamentobasico.com.br